terça-feira, abril 29, 2014

EXPERIMENTALISMOS POÉTICOS, ANOS 60

aviso prévio: dai esmola aos pobrezinhos e conquistai o reino dos céus.
 
matar a fome dos pobrezinhos não por amor aos pobres mas por temor aos deuses.

sábado, abril 26, 2014

EPISTOLÁRIO


Lisboa, 13 de Maio de 1963
Querido paizinho
O meu maior desejo, ao receber esta minha carta é que se encontre de completa saúde, que nós bem felizmente.
Recebemos a carta do pai que já esperavamos, e junto vimos as fotografias que nos enviava. Gostamos imenso delas; parece que no dia da vossa excursão o dia não estava muito bom. O pai, aparece numa fotografia completamente trajado à Inverno: gabardine, chapéu, gola levantada. Olhe que nós por cá vamos à praia, e com que calor. No domingo fui ao Estoril no habitual passeio da Igreja, e na praia estava tanta gente como em pleno Verão.
Agora vou falar-lhe do jogo de quarta-feira: Eu estava já feito à ideia de ter de escutar o relato pelo rádio, pois o Benfica não havia aceitado as propostas da R.T.P. para a transmissão directa do desafio. Assim, enquanto toda a Europa via na Eurovisão o desafio, nós, portugueses, estavamos condenados a não o vermos.
Nestas condições tudo se resignou a escutar o relato. Até se contavam anedotas, de tipos que não conseguindo arranjar bilhetes, se iam deslocar a Madrid para ver o desafio na televisão espanhola. A mãe e o Justino foram para a D. Eponina ver a televisão e eu fiquei à espera do relato. Estava o desafio a começar entra o Justino em casa a dizer que ia dar pela televisão.
Deixei imediatamente tudo, e fui ter com a mãe a casa da D. Eponina. A questão tinha sido resolvida naquele instante entre a direcção do Benfica e a R.T.P.
Gostei muito do jogo. O Feynoord parecia uma equipa de principiantes, só no fim mostrou algum do seu valor. Quanto à pancadaria que a polícia deu no fim, foi uma autêntica vergonha. Toda a Europa a assistir aquilo. O Estado procedeu a um inquérito sobre o caso, porque realmente aquilo foi vergonhoso, e não fica em casa como outras vergonhas, aquela andou por toda a Europa a ser vista. Com o que fez, a polícia não se elevou nada, pelo contrário apenas se diminuiu, porque a invasão  do campo já vem sendo hábito pelos benfiquistas, não é um facto inédito.
Cá por Lisboa, andavam holandezes em todo o sítio, e com que peneiras eles estavam.
Parece que toda aquela invasão [dos holandeses em Lisboa ], era organizada por um jornal chamado “Het Vrye Volk”, qualquer coisa que quer dizer “Povo Livre”.
Outra anedota corrente, era que a organização da tal invasão teve que fretar, à última hora, um outro navio para transportar as lágrimas.
Mas enfim, tudo acabou, no dia imediato pela manhã, desfeito o sonho, os exércitos holandezes puseram-se em debandada.
Ainda bem que eles perderam, porque se ganhassem eram capazes de inchar tanto, que até tomavam conta de nós.
À parte isto, eles eram muito boas pessoas. Falavam com toda a gente (a muito custo) e traziam sempre o emblema do Benfica.
O resto viu o pai pela televisão.
Sem mais
beijos do filho

P.S. Junto uma anedota do Mundo Desportivo.
 

domingo, abril 20, 2014

UMA EXPOSIÇÃO EM LISBOA

IGREJA DE SANTA MARIA MADALENA – QUEM É O HOMEM DO SUDÁRIO?

“Havia um homem bom e justo, chamado José. Era membro do Conselho, mas não tinha aprovado a decisão nem a acção dos outros membros. Ele era de Arimateia, cidade da Judeia, e esperava a vinda do reino de Deus. José foi ter com Pilatos e pediu-lhe o corpo de Jesus. Desceu o corpo da cruz, envolveu-o num lençol e colocou-o num túmulo escavado na rocha, onde ninguém ainda tinha sido sepultado.”
LUCAS, 23, 50-53.

quinta-feira, abril 17, 2014

CANCIONEIRO DE JOSÉ RAFAEL


Perdemo-nos de nós como se o não soubéssemos,
logo agora  que as cerejeiras estão em flor
e as tardes flamejam de luz nos vitrais do tempo.
Falam-me de ti muitos dos livros que leio,
alguns filmes, palavras  com que diariamente
me deito a pensar  no perfume de maçãs do teu corpo
naquela noite em que nos vimos pela última vez.
Aceitemos as coisas  tal como são, não há hora
nem distância que valham o pulsar dum poema.
Ainda bem termos ficado por aí, entre o tudo
e o nada, no esquecimento recíproco, seixos lívidos
sob o tumulto do rio da vida, abraçados
a uma morte terna e desejável,
única mãe de que legitimamente renasceremos.
 

quarta-feira, abril 16, 2014

BLIMUNDA SETE-LUAS

Blimunda, painel de azulejos a partir de pintura de ROGÉRIO RIBEIRO (1930-2008). Está na fachada da casa lisboeta de Pilar e José Saramago. A lua e o sol por cima da cabeça e nas mãos o pão cerceador dos poderes: "Juro que nunca te olharei por dentro", disse ela a Baltasar. (Foto de 14/4/2014)
 

terça-feira, abril 15, 2014

POESIA PURA

Mandaram-me este poema no outro dia, com imagem e tudo:


Bastava que dissesses a palavra exacta,
que tens aprisionada na garganta,
Bastava que pendurasses
na porta do teu quarto um lenço branco.


Bastava que enfeitasses o chapéu
com as flores que o fim da tarde
põe sedentas da luz dos teus cabelos.

Bastava que me olhasses uma vez ainda....


Torquato da Luz

Fábrica de Escrita
(imagem: Scarlett Johansson)